As principais leis sobre Licitação Pública e Contratos Administrativos: o que sua empresa precisa saber antes de contratar com o poder público?

O regime jurídico das licitações públicas e contratos administrativos, no Brasil, é composto por inúmeras normas. Nesse aspecto, um ponto que sempre causa certo receio para quem trabalha com licitações públicas e contratos administrativos, sem dúvida, diz respeito à necessidade de conhecer múltiplas legislações, já que não existe um código normativo unificado regulamentando as licitações e contratações públicas.

Assim, este tópico apresenta uma introdução às principais normas legais relacionadas com o tema, em conjunto com suas características e âmbitos de aplicação, como forma de auxiliar as empresas que desejam contratar com o Poder Público.

Constituição Federal

 No ponto mais alto do ordenamento jurídico nacional, como lei fundamental do Brasil, servindo de parâmetro de validade a todas as demais espécies normativas, encontra-se a Constituição Federal.

A Constituição prevê em seu artigo 37, inciso XXI, como regra, a obrigatoriedade de realização de procedimento licitatório:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:  

[…]

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Esse dispositivo serve como verdadeiro norte para a matéria. Merece, em verdade, um destaque especial, pois possui grande riqueza em seu conteúdo, estabelecendo diretrizes essenciais sobre o regime jurídico das contratações públicas brasileiras.

Como devemos compreender e interpretar adequadamente o artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal?

A primeira oração do inciso XXI do artigo 37 da Constituição Federal (“ressalvados os casos especificados na legislação, […]”) traz, já de início, uma regra de exceção bastante importante: a de que a legislação pode estipular casos excepcionais em que o processo de licitação pública não será obrigatório. É o que ocorre no caso de dispensa de licitação – quando o valor do objeto a ser contratado é considerado baixo, por exemplo – e de inexigibilidade de licitação – quando só há um fornecedor que pode entregar o produto desejado, por exemplo – previstos na Lei Federal nº 14.133/2021.

Seguindo no texto constitucional, lê-se que “[…] as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública […]”. Aqui, fica estabelecido o processo de licitação pública como a regra geral para que o Estado contrate com o particular, qualquer que seja a finalidade e o objeto do contrato, exceto para os casos de ressalva previstos em lei.

 A imposição ao Estado, e por ele próprio, de que o processo de licitação pública seja a regra para a contratação com particular não se limita, porém, a este requisito, já que a sequência da redação é a de que este processo deve ocorrer assegurando-se “[…] igualdade de condições a todos os concorrentes […]”. A garantia aqui resguardada é a de que haverá igualdade de tratamento para os licitantes, o que também é denominado como a necessária isonomia entre os licitantes.

 Ademais, no que diz respeito ao contrato administrativo a ser firmado com a vitória no processo de licitação, o texto constitucional impõe que sejam mantidas as condições efetivas da proposta e a existência de cláusulas que estabeleçam à Administração Pública as obrigações de pagamento ao particular. Trata-se do conhecido direito ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato. É que, se, para o Estado o objetivo final da contratação pública é cumprir as suas atribuições dirigistas, em prol do bem-estar social dos cidadãos, para o particular contratado o objetivo final é atender o contrato e auferir lucro, sem que seja prejudicado por eventos imprevisíveis ou inevitáveis, ou mesmo por fato causado pela Administração.

Por fim, a redação final do inciso XXI do artigo 37 da Constituição prevê que o processo de licitação pública “[…] somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações”. Esta disposição prevê o que se entende por dever de proporcionalidade, a saber: a Administração só pode exigir requisitos mínimos de participação no processo de licitação pública, que sejam estritamente necessários à execução do objeto do contrato a ser celebrado, sob pena de invalidade do certame. Esse dispositivo, então, orienta o conteúdo das demais normas jurídicas sobre a matéria.

O inciso XXVII do artigo 22 da Constituição Federal e a questão da competência para legislar sobre licitações e contratos administrativos

Faz-se válido abordar também o inciso XXVII do artigo 22 da Constituição Federal, cuja previsão é a seguinte:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

[…]

XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III;

Ou seja, a União é o ente federado com maior amplitude de competência legislativa sobre licitações públicas e contratos administrativos. Em outras palavras, a regra é de que os Estados, Distrito Federal e municípios não poderão legislar sobre normas gerais de licitações e contratos administrativos; poderão, por sua vez, legislar sobre normas especiais.

Apesar de não existir consenso sobre o que seriam exatamente “normas gerais”, em contraposição às “normas especiais”, existem alguns núcleos de concordância sobre o tema, como aquelas normas gerais previstas na Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei 14.133/21) que tratam de: (i) modalidades e tipos de licitação; (ii) hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação. Desse modo, um município não poderá, por exemplo, produzir uma lei que venha a introduzir uma nova modalidade de dispensa do procedimento licitatório, sob pena de inconstitucionalidade.

Outras previsões: O artigo 173, §1º, inciso III e a necessidade de lei específica para regular o procedimento licitatório das empresas estatais e o artigo 175 e o dever de prestação de serviços públicos por parte do Estado

Ainda da Constituição Federal, outra previsão que merece atenção é a do artigo 173, §1º, inciso III. Este dispositivo prevê a necessidade de lei específica para regular o procedimento licitatório das empresas estatais:

Art. 173. […] § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:  […]  III – licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública;

Essa lei já existe: trata-se da Lei nº 13.303/2016, a qual será analisada mais adiante neste artigo.

No mais, outro dispositivo constitucional a ser citado é o artigo 175, segundo o qual “Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos”. Esse dispositivo, em resumo, indica o dever do Estado brasileiro de prestar serviços públicos, seja de forma direta ou indireta. Se indireta, por meio de concessão ou permissão, mas, nesse caso, sempre por intermédio de licitação.

Diretrizes da Constituição Federal sobre o tema das licitações públicas:

Portanto, para além das regras materiais previstas no inciso XXI do artigo 37, verifica-se que a Constituição Federal estabeleceu as seguintes diretrizes no que tange ao tema das licitações públicas:

(i)  é competência privativa da União estabelecer normas gerais em matéria de licitação e contratação pública;

(ii) traz, como regra geral, a obrigatoriedade da licitação para todos os órgãos da administração pública, direta e indireta, nas três esferas de governo;

(iii) traz a obrigatoriedade da licitação também para as empresas públicas e sociedades de economia mista, e respectivas subsidiárias, devendo fazê-lo, entretanto, segundo procedimento estabelecido em regulamento próprio;

(iv) traz a obrigatoriedade do Estado ao prestar serviços públicos de forma indireta, seja por meio de concessão ou permissão, de obrigatoriamente promover processo licitatório.

Lei Geral das Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021)

 A Lei nº 14.133/21 trata das normas gerais de licitação e contratos administrativos. De modo geral, ela é a norma que regulamenta o artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, instituindo normas para licitações e contratos da Administração Pública e dando outras providências.

Esta lei predispõe, já em seu primeiro artigo, que se trata de uma lei que “estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.

Nesse aspecto, a Lei nº 14.133/2021, ao estabelecer normas gerais sobre licitações e contratos administrativos no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aborda o uso de processos licitatórios para a realização de:  obras; serviços, inclusive de publicidade (disciplinado complementarmente por lei específica, a Lei nº 12.232/10); compras; alienações; locações; concessões e permissões (disciplinadas por leis específicas, as leis nº 8.987/95 e Lei nº 9.074/95).

Nesse âmbito, podem ser citados como alguns dos principais artigos e previsões da Lei nº 14.133/2021, os seguintes:

  1. as modalidades de licitação, que estão previstas no artigo 28 e são as seguintes: pregão, concorrência, concurso, leilão e o diálogo competitivo;
  2. as hipóteses em que a licitação é dispensável, ou seja, em que é permitido que um poder público realize uma contratação direta, prevista no art. 75 da Lei nº 14.133/2021;
  3. as hipóteses em que a licitação é inexigível, ou seja, em que não pode ser exigido que o poder público conduza um processo licitatório para a contratação, visto que a competição entre empresas ou profissionais é inviável, prevista no art. 74 da Lei nº 14.133/2021;
  4. os requisitos de documentação para que uma empresa se habilite a participar de licitações, previstos no art. 62 da Lei nº 14.133/2021;
  5. como devem ser apresentados os documentos para a habilitação, previsto no art. 70 da Lei nº 14.133/2021;
  6. os procedimentos formais que devem ser seguidos para julgar as propostas recebidas dos licitantes, os participantes da licitação, previsto no art. 43 da Lei nº 14.133/2021;
  7. as cláusulas necessárias no contrato fechado com a empresa que vencer a licitação, correspondente ao art. 92 da Lei nº 14.133/2021;

Estatuto Jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias (Lei nº 13.303/2016)

Atualmente, a expressão “empresas estatais” é utilizada na doutrina para se referir de modo geral a qualquer uma das entidades empresariais regidas pela Lei nº 13.303/2016. São as empresas públicas e as sociedades de economia mista e suas subsidiárias dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, ainda que a atividade econômica esteja sujeita ao regime de monopólio da União ou seja de prestação de serviços públicos.

A Lei nº 13.303/2016 é a chamada de Lei das Estatais e, desde a sua promulgação, tem regido, na condição de estatuto especial, as licitações e os contratos administrativos realizados por essas entidades.

Em outras palavras, a Lei nº 13.303/2016 foi criada com a finalidade de definir regras mais claras e rígidas para essas empresas no que diz respeito a compras, licitações e nomeação de diretores, presidentes e membros do conselho de administração.  Dessa forma, o seu intuito maior é evitar episódios de corrupção, sobrepreço e qualquer tipo de interferência política indevida em instituições dessa natureza, garantindo relações mais transparentes entre elas e seus fornecedores.

Inclusive, em virtude do contexto acima, a Lei das Estatais mescla institutos de direito privado e de direito público, criando mecanismos de transparência e governança que devem ser observados, o que inclui: (i) regras para divulgação de informações; (ii) práticas de gestão de risco; (iii) códigos de conduta; (iv) orientações para fiscalização do Estado e da sociedade; (v) constituição e funcionamento de conselhos; e, é claro, (vi) normas de licitações e contratos.  As regras de licitações e contratos estão previstas entre os artigos 28 a 84 da lei nº 13.303/2016.

Uma das principais exigências da Lei nº 13.303/2016 é a de que seja produzido, por cada empresa estatal, um regulamento interno prevendo os procedimentos para a realização de licitações e formalização de contratos administrativos.

Serviços de publicidade prestados por intermédio de agências de propaganda (Lei nº 12.232/2010)

A contratação de agências de propaganda pela Administração Pública, originalmente, era realizada pela Lei nº 8.666/93 (antiga Lei de Licitações e Contratos Administrativos). Contudo, esta legislação apresentava regras e procedimentos que não permitiam, eficientemente, a escolha da melhor proposta para prestação de serviços por agências de publicidade, já que a ferramenta e diferencial neste mercado é a criatividade dos profissionais, característica capaz de ser valorada apenas subjetivamente.

Surgiu então a Lei nº 12.232/2010, que criou regras próprias para a contratação de agências de propaganda.

As principais características diferenciadoras nas licitações para a contratação de agência de propaganda estão relacionadas com a forma de apresentação e julgamento das propostas dos participantes.

Em linhas gerais, cada licitante propõe à Administração um plano de comunicação publicitária, o qual contém uma campanha desenvolvida a partir de um desafio publicitário comum a todos os participantes.

Este plano de comunicação publicitária, em conjunto com informações técnicas sobre os próprios licitantes, é julgado por uma subcomissão técnica especializada, formada a partir de um sorteio para a escolha de profissionais isentos, listados pela Administração, com formação em comunicação, publicidade ou marketing ou que atuem em uma dessas áreas. 

A Lei trata de enumerar diversos procedimentos para garantir a objetividade necessária às decisões da subcomissão técnica, tais como a anonimização e a padronização das formas de apresentação das propostas técnicas (especificamente, do plano de comunicação publicitária), permitindo o conhecimento do autor apenas depois da revelação das avaliações.

Lei Complementar nº 123/06

A Lei Complementar nº 123/06 trata do Estatuto da Microempresa e empresa de pequeno porte. Esta lei é relevante no que toca às contratações públicas porque estabelece as regras gerais de tratamento diferenciado e preferencial para microempresas e empresas de pequeno porte (MEs e EPPs) nas licitações.

Em síntese, os principais benefícios e vantagens das MEs e EPPs nas contratações públicas brasileiras são os seguintes:

Critério de desempate favorável às MEs e EPPs, quando em disputa com outras empresas (artigos 44 e 45);

Existência de licitações em que somente MEs e EPPs podem participar, com itens de contratação cujo valor é de até R$ 80 mil (art. 48, I);

Possibilidade de que haja exigência de que o contratado pela Administração Pública subcontrate MEs ou EPPs (art. 48, II);

Existência de cotas reservadas a MEs e EPPs, em montante de até 25% do quantitativo, em licitações de bens de natureza divisível (art. 48, III)

Possibilidade de privilegiar a contratação de MEs e EPPs sediadas local ou regionalmente, inclusive mediante o pagamento de preços superiores aos praticados por outras empresas (até 10%  do melhor preço válido encontrado) (art. 48, §2º)

Exigência de comprovação de regularidade fiscal e trabalhista das microempresas apenas por ocasião da assinatura do contrato (Arts. 42 e 43)

As previsões contidas nesta lei configuram o tratamento diferenciado que o Estado brasileiro dedica às MEs e EPPs, o que objetiva fomentar o desenvolvimento nacional sustentável, a partir de uma política de incentivos.

Considerações finais

Você possui alguma outra dúvida ou sugestão em relação ao tema? Entre em contato com a gente por um dos nossos meios de contatos informados abaixo que um dos nossos advogados especialistas em licitações públicas e contratos poderá atendê-lo(a). avizinha com a Instrução Normativa RFB nº 2.219/2024. Entre em contato e agende uma consulta conosco!

Murillo Preve Cardoso de Oliveira

As principais leis sobre Licitação Pública e Contratos Administrativos: o que sua empresa precisa saber antes de contratar com o poder público?.

Florianópolis: PMV Advogados Associados, 2025.

Disponível em:

Acesso em: 25 abr. 2025

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